Prezado estudioso,
É possível modificar o que a nossa sociedade denomina "realidade"
com o pensamento? Se for possível, quais realidades, quais
pensamentos podem alterá-las, de que modo isso pode ou deve ser
realizado?
Vamos a exemplos diversos. Em meio a uma existência fatigante,
intrincada, uma pessoa imagina com veemência os bálsamos de uma vida
em uma enseada junto ao mar, em uma confortável residência, com seus
livros e amigos queridos. Isso pode migrar de sua imaginação para
algo tangível, factual?
Na eminência de uma falência, com a imediata demissão de trinta
funcionários, o empresário idealiza, medita com pertinácia que uma
solução ocorre a qualquer momento. Isso alcança uma efetividade na
sociedade tal qual ele considera em seu íntimo?
Genuinamente ao pensar, meditar, reflexionar, sobre contextos e
aspectos é plausível considerarmos que uma determinada pessoa possa
mudar realidades materiais, orgânicas, organizacionais de um mundo
social como este no qual vivemos? Ou tudo não passaria de uma utopia
inquietante fadada inevitavelmente a frustrações, tristezas?
Desde Teeteto, de Platão, a opinião justificada, verdadeira, como
base do conhecimento foi retomada. Uma das vezes, agora no século
XXI, no instante em que epistemólogos reeditam os embates entre
racionalistas e empiristas. Enquanto isso, uma pessoa pensa em
alguém com quem não conversa há dez anos e inopinadamente o telefone
toca com a pessoa pensada falando do outro lado da linha; alguém em
uma aldeia insular intui que as chuvas serão generosas para as
plantações (mesmo diante de previsões contrárias das agências
meteorológicas) e as chuvas se fazem de forma inaudita abundantes.
Wilfrid Sellars (Empirismo e Filosofia da Mente) afirma que "...o
conhecimento empírico, com a sua sofisticada extensão, a ciência, é
racional, não por ter uma fundação, mas por ser um empreendimento
autorregulador que pode colocar qualquer afirmação em questão...".
Em seu nominalismo psicológico, Sellars avança de Hume a Kant. Neste
sentido, o filósofo aponta que as intuições estarão ligadas aos
conceitos e o espaço agora possui suas estradas.
Giovanni Reale (O Saber dos Antigos - Terapia para os tempos atuais)
fomenta a discussão: "um dos maiores males contemporâneos consiste
na redução maciça do homem a uma única dimensão. Trata-se de uma
consequência direta do mal...depois de se negar uma outra dimensão
do ser além da física, o homem passa a ser uma realidade física ou
meramente física, e todas as suas características consideradas
espirituais tornam-se apenas epifenômenos do físico". Também por
isso aceitar que o pensamento (imaterial?) atue em propriedades
físicas passou a ser remoto, improvável?
E se considerarmos que reduzimos a pessoa a limites que alijaram sua
existência de propriedades que lhe eram naturais, orgânicas? Peter
Strawson, por exemplo, reforça que aparentemente o homem buscando
ser mais, amputou partes que lhe pareciam incômodas; tornou-se
menor, mas sua ilusão de si mesmo o enganou disso. Afirma Peter
Strawson em Indivíduos: "O conceito de uma pessoa é logicamente
anterior ao de uma consciência individual. Não se deve analisar o
conceito de uma pessoa como o de um corpo animado ou de uma alma
corporificada. Isso não quer dizer que o conceito de uma consciência
individual pura não poderia ser uma existência logicamente
secundária, se alguém pensar, ou julgar, que isso é desejável.
Falamos de uma pessoa morta - um corpo - e da mesma maneira
secundária podemos pelo menos pensar em uma pessoa descorporificada.
Uma pessoa não é um ego corporificado, mas um ego poderia ser uma
pessoa descorporificada, mantendo o benefício lógico da
individualidade de ter sido uma pessoa".
O Neoplatonismo que despontou do século III até o século VI, depois
com pensadores judeus e islâmicos na Idade Média, e então as
releituras do Renascimento, agora é revigorado por pensadores que
utilizam psicologismos e filosofias como amálgama de construção para
o mundo. Muitos deles consideram que nossos pensamentos são
fundamentais para mudar, para consolidar, para dimensionar o que
denominamos como realidade.
Como a Filosofia Clínica dialoga com tais aspectos?
Convido você a participar desse estudo introdutório com filmes,
livros, encartes por três dias, de 8 a 10 de janeiro.
Um abraço,
Lúcio
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